sexta-feira, 30 de março de 2018




Não há senão um verso por escrever
e sobre a areia branca a breve espuma.

Manuel Alegre




quinta-feira, 29 de março de 2018



Os povoadores da beira Douro
conhecem o pó e as pedras.
E sabem que o Universo
concebe cerejais e parras.
Vivem como vermes magníficos,
iluminados por dias soalheiros,
obscurecidos pelas invernias.




                                                           Fiama Hasse Pais Brandão




sábado, 24 de março de 2018




Quis envolver-me na sombra e subir com a sombra 
e a sombra era o fogo não o lume tranquilo
da lucidez e do verde das árvores
Apenas entrevi o ouro da água
e não me banhei nela não a sulquei com um barco de folhas
Dispersei-me na areia sem me apagar
e fui sempre uma sombra obstinada


Antonio Ramos Rosa




quinta-feira, 22 de março de 2018



Eu sou o que estou a ver o homem que está

e sou no seu estar
Não poderia querer mais do que esta visão 
porque sei que é tudo o que posso receber
e tudo o que sou neste momento


António Ramos Rosa




quarta-feira, 21 de março de 2018

terça-feira, 20 de março de 2018




É aqui o eterno recanto onde a água diz

a pura praia da infância.

Aqui bebe e bebe longamente
o hálito da tristeza no silêncio da vida,
aqui, ó pátria de água calada e de pão doce,
da fundura do tempo, da lonjura permanente,

(...) aqui mereço-te.

António Ramos Rosa





segunda-feira, 19 de março de 2018



Na tua casa havia uma aldeia
onde sempre foste todos os habitantes.
O ar vinha cantando dos campos da lua,
entrava em festa pelas frestas, pelas ruas,
doirando até à pele...

Joaquim Pessoa, 
Pai




domingo, 18 de março de 2018



Creio nas palavras
transparentes
que pertencem ao vento
ao sal
à latitude pura

Aqui
no meu reduto
entre ramos de ar
entre a cintilante indolência da água
creio no que nos une
em ondas vagas
apaixonadamente lentas

Aqui
eu pertenço
ao centro da nudez
como uma gota de água
ao rés do solo
na sua imediata e nua felicidade


António Ramos Rosa





Eis o lugar em que o centro se abre
ou a lisa permanência clara,
abandono igual ao puro ombro
em que nada se diz
e no silêncio se une a boca ao espaço.

Pedra harmoniosa
do abrigo simples,
lúcido, unido, silencioso umbigo
do ar.

o teu corpo
renasce
à flor da terra.
Tudo principia.



António Ramos Rosa




sábado, 17 de março de 2018



Não sei se respondo ou se pergunto.
Sou uma voz que nasceu na penumbra do vazio.
Estou um pouco ébria e estou crescendo numa pedra.
Não tenho a sabedoria do mel ou a do vinho.
De súbito ergo-me como uma torre de sombra fulgurante.
A minha ebriedade é a da sede e a da chama.
Com esta pequena centelha quero incendiar o silêncio. 
O que eu amo não sei. Amo em total abandono.
Sinto a minha boca dentro das árvores e de uma oculta nascente.
Indecisa e ardente, algo ainda não é flor em mim.
Não estou perdida, estou entre o vento e o olvido.
Quero conhecer a minha nudez e ser o azul da presença.
Não sou a destruição cega nem a esperança impossível.
Sou alguém que espera ser aberto por uma palavra.


Antonio Ramos Rosa




quinta-feira, 15 de março de 2018



Diz-me agora o teu nome

se já dissemos que sim
porque me olhas assim
pelo olhar que demora

porque me rondas assim

Fausto Bordalo Dias





quarta-feira, 14 de março de 2018

terça-feira, 13 de março de 2018



Horas, horas sem fim,
pesadas, fundas,
esperarei por ti
até que todas as coisas sejam mudas.


Até que uma pedra irrompa
e floresça.
Até que um pássaro me saia da garganta
e no silêncio desapareça.



Eugénio de Andrade







domingo, 11 de março de 2018




(...) sob a terra estéril devastada,
uma fonte escondida. Dela brota
uma água fresca e viva que é também uma luz,
a mais intensa luz, a luz mais pura.



Eloy Sánchez Rosillo







Não somos a casa
somos a montanha 
e o relento

José Tolentino de Mendonça





quinta-feira, 8 de março de 2018





Falei de tudo quanto amei. 

De coisas que te dou 
para que tu as ames comigo: 
a juventude, o vento e as areias. 


Eugénio de Andrade







O futuro do homem é a mulher
É ela a cor da sua alma
Ela é o seu rumor e ruído
E sem ela, ele é apenas uma blasfémia
É apenas um núcleo sem o fruto
Sua boca sopra um vento selvagem
Sua vida pertence à devastação
E a própria mão o destrói.

Louis Aragon




terça-feira, 6 de março de 2018



Mãe, eu vou-me embora – esperei a vida inteira por quem
nunca me amou e perdi tudo, até o medo de morrer. A esta
hora as ruas estão desertas e as janelas convidam à viagem.
Para ficar, bastava-me uma voz que me chamasse, mas
essa voz, tu sabes, não é a tua – a última canção sobre
o meu corpo já foi há muito tempo e desde então os dias
foram sempre tão compridos, e o amor tão parco, e a solidão
tão grande, e as rosas que disseste um dia que chegariam
virão já amanhã, mas desta vez, tu sabes, não as verei murchar.


Maria do Rosário Pedreira




sábado, 3 de março de 2018




Sobre a água estarei solto de caminhos
Dos que vierem nenhum barco é para ti
Não deixes a candeia acesa
Dorme:basta-me essa luz


Daniel Faria



sexta-feira, 2 de março de 2018



Podes correr comigo pela praia fora, aqui ninguém nos vê, somos só nós e o mar, saltas a meu lado como se fosses um pedaço de areia e vento...

Manuel Alegre